Rafael Guerche - pequenos manifestos, prosas, poesias e dramaturgismos...
...meus fragmentos...
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
PARA ARTHUR RIMBAUD
Saudade de um irmão poeta que se retirou para um descanso eterno, há muito nos deixou, a nós encantados pela sua poesia.
Tenho sonhado com aquelas tardes em Paris, quando as tuas palavras me aqueciam no inverno das estações e o meu coração palpitava na tua presença ás vezes doce, ás vezes tão arredio e indelicado como a um animal primitivo e selvagem.
Mas os teus versos em muito nos inspiraram.
Te marginalizamos e amaldiçoamos o teu nome, mas nunca, jamais te esquecemos. Não pude esquecer os teus olhos que a mim enfeitiçavam, a tua presença mística sempre me alimentou. E você tão jovem, com um peito tão cheio de sabedoria e os pensamentos transbordantes em provocações.
Poeta alquímico, mágico, encantado.
O teu espírito pertence àquela tribo primitiva que cantava ao sol, e dançavam ao redor do fogo embriagados pelo vinho sagrado, entorpecidos pelos deuses.
Tu sabes que por ti o meu amor é tão pleno. Minha primeira paixão, minha consciência de que um dia despertei em meio á temporada no inferno, sendo consumido por todos os vícios e todas as virtudes. Morrendo e renascendo sempre, á cada lampejo de luz da eternidade que é o céu misturado ao mar.
Hoje canto o teu nascimento Arthur, meu pequeno nobre de cabelos dourados coroados de hera e flores de ópio reluzidas pelos corpos astrais.
Ainda me lembro da tua chegada aqui entre nós, você se anunciando. “Eu, Jean Nicolas Arthur Rimbaud”... Não a anunciação de um nome apenas, mas de um novo tempo para nós os poetas e de uma pequena luz para nós os atormentados pelas noites infernais, não uma luz de esperança ou de um Cristo Salvador, de uma luz apenas, da luz Arthur Rimbaud.
Sou eternamente grato por me iniciar na magia dos teus versos.
Para sempre teu.
Em 20 de outubro, para festejar os teus anos, querido Arthur.
quarta-feira, 25 de agosto de 2010
Noite na floresta, a lua alta iluminando juntos das estrelas
Somos muitos e juntos formamos um grande círculo
Em coro contemplamos com danças e louvores ao sagrado mascarado e suas máscaras douradas sagradas
Estávamos fundidos a energia infinita do cosmos, brilhávamos como intensas luzes, assim como nossas irmãs estrelas no céu
Em transe cantávamos, nós irmãs, as primeiras iniciadas na magia do deus nascido duas vezes e que evocávamos como DIO-NISO
IÓ, IÓ, IÓ, DIO-NISOS AQUI CONOSCO ESTÁ, gritávamos em nossas sagradas loucuras e em nossa sagrada embriaguez
Girávamos freneticamente, nossos passos não estancavam, caminhávamos para órbitas desconhecidas e terras estrangeiras, povoávamos em nossos delírios, passados ainda mais remotos
Nosso destino desde o princípio era ao deus contemplar
Éramos as Mênades, as musas das poesias satíricas e as dançarinas xamânicas das primeiras danças-transe
Ao redor da alta fogueira adorávamos a força criadora
Assim como a chama, queimávamos de encantamento
Ali mesmo ao redor do fogo recebíamos nossos ensinamentos, nossa curas, nossas magias alquímicas
Transformávamos a uva, nosso sagrado fruto,em vinho, nossa sagrada bebida, mágica e encantada
Ali diante da luz dourada das labaredas recebíamos as sagradas instruções de que sempre retornaríamos a esta terra, e que seríamos poetizas da eternidade
A força da floresta a nós protegia, força misteriosa e grandiosa que fazia a terra tremer sob os nossos pés e o céu balançar sobre nossas cabeças. Força que alimentava o nosso coro, que movimentava nossa orquestra
Nossos sagrados instrumentos se misturavam as folhas, frutas e terra da floresta Tocávamos flautas. Batíamos com o punho firme em nossos tambores gigantes e ecoávamos todas as vozes da floresta
E em meio a estes sons Dioniso nos ensinava seus cantos e conosco cantava, conosco dançava, e nos amava - carne, mente e espírito
Nos tomava por suas filhas amadas e amantes
Do alto dos montes nossas vozes eram ouvidas, rasgavam o silêncio da noite e tudo se colocava ao nosso ritmo dançar
Tomávamos poções sagradas que chegavam até nós pelas mãos do deus, sonhávamos maravilhosamente e nos perdíamos em meio de tanto encantamento para nos encontrar maiores e mais inteiras, saíamos de dentro nossos pequenos corpos e erámos transformadas na imensidão do universo, pertencíamos a um só grande corpo, como sagradas bacantes integradas a um mesmo rito, contemplando um mesmo deus com suas muitas faces e com seus misteriosos desejos
Nossas magias atravessaram todos os tempos, alcançaram novas eras, e seguem iluminando-as
Estaremos sempre aqui presentes, e somos muitas e povoamos muitas dimensões
Cantemos, ó cantemos, minhas encantadas irmãzinhas
Dioniso está aqui mais uma vez, como sempre esteve e como sempre estará em toda sua eternidade
Vem acompanhado do seu pássaro dourado - voemos, voemos, a nobre Fênix aqui está.
domingo, 15 de agosto de 2010
terça-feira, 27 de julho de 2010
Me disseram várias vezes que quem ama perdoa.
E só perdoa quem sabe se perdoar, e só é perdoado quem a si mesmo perdoa, e perdoando se é perdoado.
Muitas foram ás vezes em que não pedi perdão, fiquei com receio, não por deixar de ser perdoado, mas de me colocar na humildade daquele que pede ao outro perdão.
Muitas também foram ás vezes que me pediram perdão, nem sempre com palavras, muitas vezes com olhares inocentes, pequenos gestos, e novamente receoso não perdoei, por acreditar que as causas dos desafetos perdurariam.
Estes instantes foram me ensinando que o perdão é um ato de amor, talvez o mais singelo e necessário. Tem muita coisa na vida que se apresenta como o desconhecido, coisas que vivemos porque vivê-las supre a obrigação de dar-lhes sentidos. Sinto amor por tudo o que em mim despertou ódio, rancor e tristezas. Um amor humano, que vem do coração, que me ensina a acolher, vou aprendendo também que o amor é esta coisa repleta de contradições, porque amo aquilo que fere o meu amor, acolho o meu desamparo e ilumino o que me aponta como escuridão. O amor não é uma dádiva dos céus, é a nossa extinta necessidade primitiva de aceitar o outro na sua condição, sobretudo na condição de não nos amar, ou nos amar com tantas diferenças. O amor é o próprio ato do perdão, o perdão não tem valores, perdoa porque se ama e amando o outro perdoamos. Amar é correr todos os riscos possíveis de não ser amado e ainda assim permanecer amando o desamor, mas também é correr o risco de ser amado e isto não trás dificuldades menores. O perdão é o olho que vê o passado mas aprende transformá-lo. Hoje me deu uma enorme vontade de dizer ao meu ser o quanto eu o perdôo por todos os erros e crimes, me deu vontade de matar todos os meus julgamentos, de correr o risco de ser livre, livre mesmo, porque nada me impede de seguir, de ser eu. Também preciso perdoar, porque neste momento pode haver um coração precisando da leveza deste meu ato ou ao menos da doçura mansa do meu olhar. Perdoar é aprender a confiar no tempo, acreditar que a transformação rege o universo e todos os seres. Não negue um abraço a quem te negou naquele instante em que mais necessitava daquele abraço, porque o tempo que passa e transforma suprirá aquela falta com o abraço que apenas você pode dar. Amando se aprende a perdoar e perdoando se pode amar. Então: EU TE AMO!, ME PERDOA? EU TE PERDÔO. EU TE AMO...
E só perdoa quem sabe se perdoar, e só é perdoado quem a si mesmo perdoa, e perdoando se é perdoado.
Muitas foram ás vezes em que não pedi perdão, fiquei com receio, não por deixar de ser perdoado, mas de me colocar na humildade daquele que pede ao outro perdão.
Muitas também foram ás vezes que me pediram perdão, nem sempre com palavras, muitas vezes com olhares inocentes, pequenos gestos, e novamente receoso não perdoei, por acreditar que as causas dos desafetos perdurariam.
Estes instantes foram me ensinando que o perdão é um ato de amor, talvez o mais singelo e necessário. Tem muita coisa na vida que se apresenta como o desconhecido, coisas que vivemos porque vivê-las supre a obrigação de dar-lhes sentidos. Sinto amor por tudo o que em mim despertou ódio, rancor e tristezas. Um amor humano, que vem do coração, que me ensina a acolher, vou aprendendo também que o amor é esta coisa repleta de contradições, porque amo aquilo que fere o meu amor, acolho o meu desamparo e ilumino o que me aponta como escuridão. O amor não é uma dádiva dos céus, é a nossa extinta necessidade primitiva de aceitar o outro na sua condição, sobretudo na condição de não nos amar, ou nos amar com tantas diferenças. O amor é o próprio ato do perdão, o perdão não tem valores, perdoa porque se ama e amando o outro perdoamos. Amar é correr todos os riscos possíveis de não ser amado e ainda assim permanecer amando o desamor, mas também é correr o risco de ser amado e isto não trás dificuldades menores. O perdão é o olho que vê o passado mas aprende transformá-lo. Hoje me deu uma enorme vontade de dizer ao meu ser o quanto eu o perdôo por todos os erros e crimes, me deu vontade de matar todos os meus julgamentos, de correr o risco de ser livre, livre mesmo, porque nada me impede de seguir, de ser eu. Também preciso perdoar, porque neste momento pode haver um coração precisando da leveza deste meu ato ou ao menos da doçura mansa do meu olhar. Perdoar é aprender a confiar no tempo, acreditar que a transformação rege o universo e todos os seres. Não negue um abraço a quem te negou naquele instante em que mais necessitava daquele abraço, porque o tempo que passa e transforma suprirá aquela falta com o abraço que apenas você pode dar. Amando se aprende a perdoar e perdoando se pode amar. Então: EU TE AMO!, ME PERDOA? EU TE PERDÔO. EU TE AMO...
quinta-feira, 22 de julho de 2010
Ao ler a peça O Horácio de Heiner Muller
UM INTÉRPRETE QUE REPRESENTA UM ROMANO FALA Á HORÁCIO
O Herói Vencedor
Merece ser honrado
Deve ter o seu feito louvado por este povo
O Inimigo Assassino
Merece ser punido
Não é do seu direito derramar o sangue nosso
Será repudiado por este povo
E sentirá o sabor da mesma crueldade cometida
Acontece que não há um vencedor e um inimigo
Há um vencedor-inimigo e inimigo-vencedor
Um único homem
E este homem é você Horácio
Um Romano
Roma deveria estar ocupada com o inimigo que ameaça invadir
Enquanto julga o seu herói assassino
A sua espada duas vezes manchada de sangue
O sangue do inimigo fundido ao sangue do seu próprio sangue
Ao sangue nosso
Para este homem qual o destino que se encerra?
Honrem o Herói!
Condenem o Assassino!
E o que fazemos com o herói-assassino?
Rafael Guerche
O Herói Vencedor
Merece ser honrado
Deve ter o seu feito louvado por este povo
O Inimigo Assassino
Merece ser punido
Não é do seu direito derramar o sangue nosso
Será repudiado por este povo
E sentirá o sabor da mesma crueldade cometida
Acontece que não há um vencedor e um inimigo
Há um vencedor-inimigo e inimigo-vencedor
Um único homem
E este homem é você Horácio
Um Romano
Roma deveria estar ocupada com o inimigo que ameaça invadir
Enquanto julga o seu herói assassino
A sua espada duas vezes manchada de sangue
O sangue do inimigo fundido ao sangue do seu próprio sangue
Ao sangue nosso
Para este homem qual o destino que se encerra?
Honrem o Herói!
Condenem o Assassino!
E o que fazemos com o herói-assassino?
Rafael Guerche
quarta-feira, 21 de julho de 2010
Fragmento do texto: Manifesto para hamlet e ulisses (De quando me torenei so ser que não era sendo o ser que sou)
ULISSES (cacos de vidros) - eu já tentei ser muitos para escapar de mim mesmo. eu já tentei o suicidio, mas não foi suficiente. eu já me tranquei no quarto para não mais sair. eu já escondi de mim mesmo as chaves de todas as portas. eu já enterrei todos os mapas. eu já perdi os caminhos. eu já tive fé em todas as crenças, já fui religiosamente descrente. eu já afoguei o meu coração em gasolina, risquei o fosfóro, fiz tudo explodir pelos ares. eu já esgotei todas as lágrimas, todos os fios de cabelo, todas as dores. eu já amarguei todas as mágoas e rancores. eu já me consumi com o ódio. eu sempre volto para o mesmo lugar. eu sempre me encontro, eu o mesmo de sempre. eu queria mesmo é ser uma navalha e rasgar a carne da vida em muitos pedaços, e devorá-la como se devora os cacos de vidros, que descem arranhando a garganta.
Assinar:
Postagens (Atom)